A Legislação consumerista estreou uma nova perspectiva, estabelecendo um sistema baseado na proteção e defesa do consumidor que influencia as órbitas jurídica, econômica e política, sendo considerado um pilar para as relações econômicas atuais como previsto na redação do inciso V do artigo 170 da Constituição Federal. É de conhecimento geral que, nas relações de consumo, os sujeitos participantes dessa relação se apresentem em polos desiguais, onde, na maioria das vezes, pelo consumidor não possuir os conhecimentos específicos acerca dos seus direitos quando da aquisição de um produto e/ou serviço, este se torna a parte vulnerável. Enquanto isso, do outro lado encontra-se o fornecedor que, em certos casos, se aproveita dessa condição do consumidor submete-o a constantes desgastes, impondo-lhe momentos de aflição e atendimentos ineficazes. Com a finalidade de proporcionar o equilibro e a eficiência da defesa dos direitos dos consumidores, a mediação se mostra como o meio extrajudicial propicio para a manutenção de um diálogo eficaz entre as partes contratantes, onde o consumidor atuaria de maneira mais ativa e consciente enquanto cidadão titular de direitos e garantias.
O conflito que se desenvolve como uma consequência da relação consumerista tem sua gênese na divergência de interesses dos sujeitos que integram essa relação. Dessa forma a mediação se traduz como um modo autônomo de resolução de conflitos que implica permanecer entre as partes a titularidade do poder de decisão. É uma forma legitimada no ordenamento jurídico brasileiro e que nos dias atuais tem sua prática estimulada pelo judiciário brasileiro, como pode-se observar com o advento do novo Código de Processo Civil em seu Art. 3º; Art. 139, V; Art. 165 a 175.A Lei 13.140/15 trata amplamente desta questão e a resolução 125/10 do CNJ estabelece uma verdadeira política de tratamento adequado de conflitos.
A mediação consiste em um procedimento consensual de resolução de conflitos por meio do qual um terceiro indivíduo, imparcial e capacitado, escolhido ou aceito pelas partes, atua para encorajar e facilitar a resolução de conflitos. Os mediadores estruturam a decisão que melhor os satisfaça, sendo resultantes da convergência das vontades de ambas as partes, estando, portanto, atentos às particularidades e nuances da situação concreta. Verifica-se, assim, que há a desconstrução da ideologia ganhador-perdedor que vigora no sistema tradicional judiciário, passando, em seu lugar, a subsistir uma abordagem assentada na cooperação entre as partes envolvidas e não na competição beligerante processual. É observável, neste cenário, que a mediação se apresenta como um instrumento de solução de litígios empregado pelas próprias partes que, impelidas pelo diálogo, encontram uma alternativa ponderada, eficaz e satisfatória, como afirma a professora Amélia Soares.
Antes a mediação era entendida como caminho de solução apenas das relações passadas, mas já se entende que é caminho adequado para relações futuras e relações contínuas. A mediação quando realmente entendida e aplicada, constitui-se um forte e eficaz instrumento de transformação social, não apenas por propiciar uma profícua releitura das relações objeto dela, mas uma verdadeira “educação social”, pela compreensão, implícita ou explícita, de todo o processo do conflito, identificando suas causas e apontando soluções perenes. A mediação tem por suporte a visão positiva do problema, ensinando uma nova forma de leitura dos demais pleitos – principalmente os provenientes de uma relação continuada (tais como, as familiares e consumeristas) – o que, por consequência, redunda, de maneira direta ou indireta, na afirmação da cidadania e da paz social.
A contínua judicialização dos conflitos promove um engessamento do poder Judiciário que, em função do intenso volume de ações judiciais ajuizadas diariamente, como também da ausência de recursos financeiros proporcionais à sua atuação, acaba culminando em “um sistema processualista sem coesão com a realidade em que está inserido, não logrando êxito em uma de suas funções estruturantes, qual seja, a pacificação social”. Partindo desse cenário catastrófico, a solução seria a busca pela mediação de conflitos como um instrumento que “objetiva não apenas auxiliar a boa resolução de litígios entre as partes envolvidas, mas também administrar as relações existentes para que as pessoas mantenham seus vínculos afetivos e possam construir uma sociedade fundada numa cultura de paz”, conforme o entendimento de Lilia Sales.
A mediação se revela como instrumento extrajudicial eficaz para o estabelecimento de um diálogo em que seja possível a edificação de um consenso entre os envolvidos, amenizando o desgaste e contornando a disparidade caracterizadora da relação consumerista. Mesmo neste cenário não é possível esconder a vulnerabilidade intrínseca à figura do consumidor, expressamente previsto no texto legal, porém, a partir de uma perspectiva construtivista do diálogo como mecanismo apto para a responsabilização compartilhada dos envolvidos no conflito, de maneira a permitir que os satisfaça integralmente fugindo da decisão imposta e definitiva advinda da cultura do ativismo judicial como exclusivo meio de tratamento de conflitos, como afirma Tauã Rangel.
NOTAS
1 – Estudante do Bacharelado Interdisciplinar de Humanidades na área de Concentração Em Estudos Jurídicos pela Universidade Federal da Bahia. Associada colaboradora da Associação Baiana de Defesa do Consumidor (ABDECON).
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em 03 jan. 2014.