Após a decisão do Superior Tribunal de Justiça proferida no final do ano passado, que autorizou a utilização da mediação no processo de recuperação judicial da OI, tem-se notado o crescente interesse pelo tema entre aqueles que estão habituados a lidar com processos judiciais cada vez mais longos nessa seara.
A mediação, no entanto, encontra campo ainda mais profícuo na recuperação extrajudicial, o que ainda não foi percebido por muitas empresas e advogados.
Prevista na Lei 11.101/05, a recuperação extrajudicial permite que empresas que estão com situação financeira delicada renegociem suas dívidas com determinadas categorias de credores, visando a satisfação dos seus créditos e buscando, ao mesmo tempo, a preservação da empresa.
Entre as vantagens da recuperação extrajudicial estão a possibilidade de envolver apenas determinadas classes de devedores, a sua maior celeridade por não depender da intervenção judicial, bem como a desnecessidade de envolvimento do Ministério Público e de nomeação de Administrador Judicial, evitando ingerências externas sobre o controle da empresa, com todos os altos custos que isso acarreta.
É inegável a sinergia existente entre a recuperação extrajudicial e o procedimento de mediação extrajudicial previsto na Lei 13.140/2015, em que também se destacam a celeridade e o menor custo do procedimento.
Além disso, a mediação busca proteger a imagem dos envolvidos, em decorrência da confidencialidade do procedimento, bem como preservar as relações comerciais, com a condução do procedimento por um terceiro neutro e capacitado.
A grande maioria dos escritórios de advocacia que atuam em favor do devedor tem optado por negociar diretamente com os credores, com vistas à elaboração do plano de recuperação extrajudicial. Não obtendo êxito, desistem da solução negociada e muitas vezes partem para a recuperação judicial.
Tem se olvidado muitas vezes, porém, quanto à possibilidade de utilização da mediação. Nesse caso, adotando o procedimento previsto em Lei, a Câmara emite carta-convite para os credores definidos pela empresa convidando-os para participar de um procedimento de mediação, visando evitar a recuperação judicial.
Assume a Câmara privada então a responsabilidade de esclarecer para os credores a vantagem de se tentar a mediação, marcando sessões de pré-mediação em um ambiente neutro e imparcial, o que tende a aumentar a adesão à proposta.
Com relação àqueles que não se interessarem pela tentativa de solução extrajudicial, é lavrado um Termo de Recusa que documenta a falta de interesse do credor na solução negociada.
Aqueles que manifestam interesse pela tentativa de solução negociada, por seu turno, assinam um Termo Inicial de Mediação, que registra os pontos mínimos necessários para se dar início ao procedimento.
A participação do advogado é fundamental desde o início, a começar pela orientação do seu cliente quanto à utilização da mediação, passando pela definição dos credores que serão convidados e pelo acompanhamento de todo o procedimento. Diferentemente da situação em que o advogado assume o papel de contatar os credores e convencê-los a negociar, porém, na mediação esse ônus é assumido pela Câmara e pelo mediador, permitindo que o advogado se concentre apenas na defesa dos interesses do seu cliente.
Uma vez iniciada a mediação, é importante traçar um planejamento e definir se a mediação se desenvolverá a partir de sessões entre o devedor e cada um de seus credores, em separado, ou entre o devedor e grupos de credores reunidos em categorias, definindo também qual critério seria utilizado para essa segmentação. Esse planejamento prévio pode impactar fundamentalmente no sucesso da mediação, considerando os interesses comuns ou contrapostos existentes.
Podem ser importantes ainda as sessões de mediação individuais, em que o mediador se reúne com cada parte em separado das demais. Procedimento útil principalmente com os credores mais resistentes, a fim de tentar identificar eventuais obstáculos para o êxito da mediação. O mediador experiente certamente conseguirá identificar o momento em que a sessão individual é necessária para que se avance na negociação.
Obtendo-se êxito, exige a Lei que seja elaborado um Termo Final de Mediação, mais uma vez com o auxílio fundamental dos advogados das partes, registrando o consenso obtido e constituindo um título executivo extrajudicial. Tais acordos servirão de base para a elaboração, ao final, do plano de recuperação extrajudicial, que pode inclusive ser objeto de homologação judicial, se as partes assim o quiserem.
Considerando, contudo, que se trata exclusivamente de direitos patrimoniais disponíveis e que se terá ao final do procedimento um título executivo, é possível que as partes e seus advogados optem por encerrar o procedimento na órbita da Câmara privada de mediação, evitando os custos adicionais decorrentes de eventual homologação judicial.
Ainda, é salutar se dizer que o artigo 167 da lei recuperacional prescreve que outras modalidades de acordo privado entre o devedor e seus credores poderão ser utilizadas, o que não implicaria atividade própria de recuperação extrajudicial, mas sim de acordo privado que também poderá ser homologado em Juízo, sem que, contudo, esteja o acordo – o qual pode ser celebrado por atividade de mediação – sujeito às regras da recuperação judicial previstas na legislação própria, onde se exige a apresentação de plano de recuperação. Então, nesse sentido a legislação privilegia ainda mais aqueles devedores empresários que queiram obter de seus credores um documento, mediante atividade própria de mediação extrajudicial, por exemplo, que lhes garanta uma planejada “recuperação prática” e eficiente, sem a apresentação de plano e sem estarem sujeitos sequer às regras próprias da recuperação extrajudicial ou judicial, alcançando-se assim a preservação das atividades empresariais.
Não se pode esquecer, por fim, que oferecer essa possibilidade de solução extrajudicial constitui hoje inclusive uma obrigação ética do advogado, prevista no artigo 2º, parágrafo único, inciso VI, do Código de Ética da OAB. O cliente, certamente, tem direito de saber que o longo e penoso caminho judicial não é mais o único disponível para a solução dos seus problemas.
Por Danilo Ribeiro Miranda Martins, procurador federal da AGU, árbitro e mediador extrajudicial, MBA em Finanças pelo IBMEC. Mestre pela PUC-SP. Sócio fundador da CAMES Brasil e Diretor do Instituto de Previdência Complementar e Saúde Suplementar – IPCOM. Professor no MBA em Economia e Gestão: Previdência Complementar da FGV-DF. E Eliane Simonini Baltazar Velasco, advogada, conselheira seccional da OAB-GO, mestre em direito empresarial.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 14 de outubro de 2018, 6h40
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